sexta-feira, 22 de outubro de 2010

#15. THE KILLER INSIDE ME


"The Killer Inside Me" (EUA, 2010, 109´)
Realização: Michael Winterbottom
Argumento: John Curran, baseado no romance homónimo de Jim Thompson.
Fotografia: Marcel Zyskind
Actores: Casey Affleck ("Lou Ford"), Kate Hudson ("Amy Stanton"), Jessica Alba ("Joyce Lakeland"), Ned Beatty ("Chester Conway"), Elias Koteas ("Joe Rothman"), Tom Bower ("Sheriff Bob Maples"), Simon Baker ("Howard Hendricks"), Bill Pullman ("Billy Boy Walker").

# O realizador britânico Michael Winterbottom, um dos mais aclamados do denonimado "cinema independente" - autor de obras como "Welcome to Sarajevo" (1997), "Wonderland" (1999) e "24 Hour Party People" (2002), entre outros - apresenta nos aqui um thriller psico-dramático, uma história de crime passada numa pequena cidade do Texas no final dos anos 40.

Lou Ford é um aparentemente pacato adjunto do xerife, em Central City, uma tranquila povoação onde toda a gente se conhece, pouco ou nada se passa, e cuja taxa de crime é praticamente nula.
Quando uma prostituta, Joyce Lakeland, se instala na cidade e começa a receber algumas figuras importantes, Lou é chamado a agir. Visita-a com o intuito de a expulsar mas o encontro acaba por se tornar estranhamente violento e ambos desenvolvem uma paixão muito peculiar, de natureza sado-masoquista. Passa a visitá-la todos os dias em segredo.
Ao mesmo tempo Lou tem uma relação já antiga com Amy Stanton, a rapariga bonita de Central City, com quem planeia casar.  É isso que esperam dele, e também que substitua em breve o veterano xerife Bob Maples.
Rapidamente percebemos que Lou é um psicótico e sádico, perturbado por uma infância violenta, e uma série de acontecimentos, levam a que, para esconder a sua culpa, inicie um périplo de assassinatos que parecem não ter fim. 


Winterbottom retoma o gênero do "film-noir" nesta história perturbante, que segue o protagonista e a sua mente até aos meandros do inimaginável. Apesar de não resultar em pleno, consegue muitas vezes o seu objectivo, e intriga sem dúvida quem assiste ao filme.

Casey Affleck está arrepiante no papel de "Lou Ford". A sua constante indiferença e falta de remorsos para com as suas acções, vivem ao longo de todo o filme. Affleck consegue criar no espectador a raiva necessária para que se fique com uma sensação de âmago constante.
A beleza específica de Jessica Alba ("Joyce Lakeland"), que resulta em pleno neste personagem, faz o resto, e apesar da sua curta aparição, é ela que povoa a mente de "Lou Ford" e por isso parece que está sempre presente.


Kate Hudson está quase irreconhecível no papel de "Amy Stanton" a possessiva namorada de "Lou". Por vezes agressiva, por vezes amorosa, penso que a actriz não conseguiu encontrar o tempero certo para a sua personagem, e por isso deixa um pouco a desejar.
Um pouco ao lado também me parece a presença de Simon Baker (da série "The Mentalist"), como o Promotor Público "Howard Hendricks". Inexplicavelmente parece sempre um estranho ser (para a realidade de "Central City") durante as suas fugazes aparições.
De resto é sempre bom ver Bill Pullman e claro, o veterano Ned Beatty, no papel do homem mais poderoso da cidade,  um "Chester Conway" sem escrúpulos.

No que diz respeito à parte estética, o filme cumpre. A fotografia, direcção de arte e guarda roupa estão a um nível elevado, e a fazer jus ao estilo que o realizador idealizou.
Muitos cinzentos, muitos negros, pouca côr (e quando aparece ganha outro relevo). 


É um filme que nos faz ficar com um estranho travo, demora a digerir, e dá que pensar.

Bom para a sessão da tarde.
link para o site do filme: http://www.killerinsideme.com/

Nota: 6.5 / 10


quinta-feira, 21 de outubro de 2010

#14. THE LAST AIRBENDER


"The Last Airbender" (EUA, 2010, 103´)
Realização : M. Night Shyamalan
Argumento: M. Night Shyamalan
Fotografia: Andrew Lesnie
Actores: Noah Ringer ("Aang"), Dev Patel ("Prince Zuko"), Nicola Peltz ("Katara"), Jackson Rathbone ("Sokka"), Shaun Toub ("Uncle Iroh"), Aasif Mandvi ("Commander Zhao"), Cliff Curtis ("Fire Lord Ozai"), Seychelle Gabriel ("Princess Yue").

# Confesso que não sou, à partida, grande fã do cinema de Shyamalan. O realizador indiano - que é o autor de obras muito aclamadas pela crítica, como "The Sixth Sense" (1999), "Unbreakable" (2000), "Signs" (2002) ou "The Village" (2004) - aposta aqui noutro gênero, o filme de aventuras, dirigido sobretudo ao público infanto-juvenil.

"The Last Airbender", inspirado numa série de animação do canal Nickelodeon, é uma aventura dentro do universo do fantástico. O mundo em que se vive está dividido por quatro grandes nações, cada uma baseando-se no seu "elemento" (a Nação da Água, da Terra, do Ar e do Fogo). A Nação do Fogo quer controlar o planeta, e na ausência do "Avatar" (uma espécie de Deus que controla todos os quatro elementos), escraviza as restantes nações. Alguns dos habitantes de cada nação, possuem um poder, o de  controlarem o seu elemento. Para evitar este perigo, a nação dominante persegue e mata todos os que têm esse dom.

Aang, um membro da Nação do Ar, e último sucessor da linha de "Avatares", fugiu antes da Guerra começar e ficou acidentalmente congelado num iceberg durante cem anos. Encontrado por Katara, a única controladora ("waterbender") da Nação da Água do Sul, Aang descobre que a Nação do Fogo (sabendo que o "Avatar" fazia parte da Nação do Ar) assassinou todos os seus habitantes, incluindo os seus mestres e amigos. 


O jovem "Deus", que tinha fugido antes de completar a sua aprendizagem de controlar os quatros elementos, inicia uma luta pela reposição da liberdade e paz para a humanidade, ao mesmo tempo que procura mestres que o ajudem a terminar a sua escola de "Avatar",

O filme inicia-se com o título "Book 1 : Water" (Livro 1 : Água), o que basicamente quer dizer que estamos perante uma quadrilogia (ou trilogia já que percebemos que são as etapas que Aang tem que passar para ser tornar um "Avatar" completo, e o ar ele já domina).

Sinceramente não fiquei com muita vontade de ver o filme seguinte. Apesar de um bom trabalho ao nível gráfico e de efeitos especiais, a história é demasiado óbvia, não conseguindo ir mais além da categoria em que se insere. 

Shyamalan, porventura limitado com a quantidade de efeitos digitais que o filme tem, opta por um estilo muito básico e simples, às vezes roçando mesmo o ridículo. Os diálogos são pobres e as coreografias demasiado infantis.


As escolhas para os jovens protagonistas deixam um pouco a desejar, não conseguindo transmitir o mínimo de realidade às suas personagens, e com performances demasiado básicas.
Noah Ringer ("Aang"), Nicola Peltz ("Katara" e Jackson Rathbone ("Sokka") têm um trabalho muito fraco, e abusam muitas vezes de uma expressividade exagerada, que vem completamente fora de contexto. Dev Patel (o mesmo de "Slumdog Millionaire"), no papel do "Prince Zuko", também incorre pelo mesmo erro, excepto quando interage com os actores mais velhos. Nesses momentos consegue dar um ar da sua graça e acreditamos mais nele.
Cliff Curtis ("Fire Lord Ozai", o líder da Nação do Fogo) e Aasif Mandvi ("Commander Zhao") são os que realmente dão alguma intenção aos seus personagens, mas o destaque maior vai para o anglo/iraniano Shaun Toub, que, no papel do Iroh - irmão do rei e tio do Príncipe Zuko - dá realmente uma lufada de ar fresco quando aparece.

O trabalho fotográfico e de efeitos visuais é realmente o que sobressai no filme. Com  o oscarizado Andrew Lesnie (o mesmo da trilogia de "Lord of The Rings") não seria de esperar outra coisa. 
É de facto dos poucos factores em que o filme merece ser visto. Todos os mundos criados na história não são reais, e a direcção de arte e fotografia conseguem atingir um patamar alto. Obviamente virado mais para o universo infanto-juvenil, mas com pormenores muito interessantes. O guarda-roupa e a caracterização também merecem uma referência positiva, apesar de alguns momentos muito "naif".



No final fica realmente a sensação de um gasto enorme para um resultado demasiado fraco. Não fosse a parte estética e o filme nem valeria o tempo despendido.

Aconselhável a ver cedo, para que se possa ver outro filme a seguir, e esquecer o primeiro rapidamente.

link para o site oficial e trailer : http://www.thelastairbendermovie.com/

Nota: 3.5 / 10

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

#13. MICMACS À TIRE-LARIGOT


"Micmacs à tire-larigot" (França, 2009, 105´)
Realização: Jean-Pierre Jeunet
Argumento: Jean-Pierre Jeunet e Guillaume Laurant
Fotografia: Tetsuo Nagata
Actores: Dany Boon ("Bazil"), André Dussollier ("Nicolas de Fenouillet"), Nicolas Marié ("François Marconi"), Jean-Pierre Marielle ("Placard"), Yolande Moreau ("Tambouille"), Julie Ferrier ("La Môme Caoutchouc"), Omar Sy ("Remington"), Dominique Pinon ("Fracasse"), Michel Cremadès ("Petit Pierre"), Marie-Julie Baup ("Calculette").

# É sempre bom regressar ao universo Jeunet. O realizador francês, autor de obras tão marcantes como "Delicatessen" ou "Le Fabuleux Destin d´Amélie", traz nos uma história tocante, cheia de amor e lições de vida, especialmente importante na conjectura actual.

A vida de Bazil tem sido perseguida pelo acaso (a sorte, ou falta dela). Ainda uma criança, o seu pai morreu quando desactivava minas no Sahara Ocidental. A sua mãe não recuperou da perda e foi internada num hospício. Bazil foi levado para um convento.
Trinta anos depois, trabalha num clube de vídeo. Num estranho acidente, uma bala aloja-se na sua cabeça. Os médicos decidem, atirando uma moeda ao ar, que a melhor hipótese para ele é deixar lá a bala. Poderia morrer a qualquer instante, mas pelo menos não fica um vegetal.
Ao regressar à sua vida, é despejado da casa que arrendava, e despedido do trabalho que tinha. Não lhe resta outra solução que não a de dormir na rua, e ganhar alguns trocos com inusitadas performances artísticas. Sabendo da sua condição precoce, vive um dia de cada vez.


É então que a sua sorte muda. O seu destino faz com que se cruze com Placard, que o acolhe numa estranha família de sem abrigos, que vive num ferro-velho, todos com uma inocente e alegre dose de loucura, e cujo principal lema é : reciclar.

Decidido a vingar a deficiência a que foi submetido e a morte do seu pai, planeia uma hábil vingança contra as duas empresas que fabricaram as armas. Ajudado pelos seus novos amigos, que possuidores de notáveis capacidades quase parecem uma equipa de elite, desenvolve um plano que faz com que os dois fabricantes de armas - rivais entre eles - se destruam um ao outro.

Jeunet transporta-nos para dentro deste mundo de forma perfeita. Constantes planos-sequência, e muitas escapadelas animadas para o interior dos pensamentos do protagonista (as já habituais referências em ritmo acelerado, muito habituais nos filmes de Jeunet), enriquecem de sobremaneira esta obra. Todo o desenho de realização parece dotado de um "timing" certo.


Dany Boon, no papel de "Bazil", tem uma interpretação impressionante, fazendo-nos acreditar na ingenuidade do seu personagem durante toda a história, e carregando nos seus ombros, de uma forma muito audaz, todo o peso da capacidade humana quando confrontada com situações limite.
Aliás todo o elenco está a um nível muito elevado, contribuindo com a cereja para o já de si rico bolo de personagens de Jeunet.
Destaque para Julie Ferrier, como a sábia contorcionista "La Môme Caoutchouc", por quem "Bazil" se apaixona, Dominique Pinon faz do louco homem-bala "Fracasse",  Omar Sy, brilhante no papel do delirante "Remington", Marie-Julie Baup, numa fabulosa interpretação da obsessiva (mas no bom sentido) "Calculette", e claro Yolande Moureau, que faz de "Tambouille", a materna líder desta muito característica família de sem-abrigos. Enfim, todo os personagens parecem ter vida própria o que ilustra bem da força dramática que Jeunet aplica no seu filme. Um casting e uma direcção de actores que faz toda a diferença.

A fotografia muito específica deste mundo quase utópico faz toda a diferença, e tanto a direcção de arte, como o guarda-roupa são de um pormenor notável. Tudo está em sintonia como se de uma orquestra se tratasse. Excelente trabalho estético.


É sem dúvida uma obra que marca, também pela sua simplicidade, e por todas as pequenas lições que nos ensina, sobretudo do amor e da amizade, mas também da sorte e do destino.

A não perder. Óptimo para sessão nocturna.
link para o site do filme http://www.micmacs-lefilm.com/

Nota: 8.5 / 10

#12. GANGSTER´S PARADISE : JERUSALEMA


"Gangster´s Paradise : Jerusalema" (África do Sul, 2008, 119´)
Realização: Ralph Ziman
Argumento: Ralph Ziman
Fotografia: Nic Hofmeyer
Actores: Rapulana Seiphemo ("Lucky Kunene"), Ronnie Nyakale ("Zakes Mbolelo"), Jeffrey Zekele ("Nazareth"), Shelley Meskin ("Leah Freidlander"), Robert Hobbs ("Detective Swart"), Jafta Mamabolo ("Young Kunene"), Motlasi Mahloko ("Young Zakes"), Kenneth Nkosi ("Sithole"), Kevon Kane ("Van C), Louise Saint-Claire ("Anna-Marie Van Rensburg), Daniel Buckland ("Josh Freidlander").

# Este filme sul-africano tem sido premiado um pouco por todo o seu continente, mas passou despercebido no mercado europeu. O realizador/argumentista Ralph Ziman (cujo último filme "The Zookeeper", com Sam Neill, datava já de 2001) traz nos a história real de Lucky Kunene, considerado um dos maiores gangsters de Joanesburgo, e líder da comunidade de Hillbrow, um dos bairros mais degradados da capital.

A história é quase uma biografia da vida deste homem, criminoso para alguns, mas apelidado de "Robin dos Bosques" pelos habitantes dos bairros que controlava.

Inicia-se na sua juventude, no Soweto, em 1994, ano em que foi abolido o Apartheid. Uma onda de esperança varre a África do Sul, e muitos jovens acreditam que os seus sonhos são possíveis. Kunene quer ir para a universidade estudar economia, mas não consegue uma bolsa de estudo, e a sua vida é muito miserável. A sua mãe sustente sozinha cinco filhos, e mal tem o que lhes dar de comer. 
Desesperado, Kunene e o seu amigo Zakes, começam a procurar soluções para a sua vida e são instigados por Nazareth (um herói no Soweto, um dos lutadores da liberdade, com formação de guerrilha na ex-URSS) para cometerem pequenos delitos. Rapidamente passam para o "hi-jacking" e vão ganhando um bom pé de meia. Até ao dia que um assalto a uma loja corre mal, e assistem à morte de muitos companheiros, acabando por fugir incógnitos para a grande cidade de Joanesburgo.


Dez anos depois, Kunene e Zakes, têm um táxi e sobrevivem ao dia-a-dia. Até ao momento em que Lucky Kunene tem a ideia que vai mudar a sua vida. Decide criar uma associação de apoio aos moradores. Convence-os a entregarem-lhe a ele todas as rendas e ele é que se encarrega de negociar com o patronato. Com um plano muito bem concebido, acaba por tornar-se proprietário de uma série de prédios em Hillbrow. Visto como marginal pelas autoridades, e protegido pela comunidade, constrói um pequeno império, até à sua prisão.

Acaba por ser uma realidade semelhante ao que temos visto em filmes de outros países, mas com problemas muito parecidos. O realizador mostra abertamente a dura vida destas gentes, inseridas numa realidade pós-apartheid, com muita esperança mas poucas oportunidades.

Fiquei especialmente surpreendido pelos jovens actores Jafta Mamabolo e Motlasi Mahloko, que interpretam Kunene e Zakes em novos. Duas excelentes interpretações. 
Rapulana Seiphemo ("Lucky Kunene") consegue também preencher a tela com o seu olhar e feições fortes. Consegue juntar a agressividade e a simpatia, tornando-o num personagem muito enigmático.
Destaque também para Kevon Kane (o traficante "Van C"), num papel de uma exilado judeu-nigeriano, que se torna num dos principais inimigos de Kunene. 


Ziman opta por uma mistura de estilos, utilizando muita camera à mão nas alturas de maior tensão e contrapondo com uma linguagem mais clássica noutros momentos. Mantendo-se sempre em cima dos acontecimentos, consegue transportar nos para a realidade da comunidade.
A fotografia, muito pontuada com tons dourados e castanhos, acompanha de forma muito forte o filme, e ajuda-nos a entrar na realidade desta zona de Joanesburgo.

Mais uma boa surpresa do cinema sul-africano, que parece ganhar cada vez mais força no panorama internacional.

Bom para uma sessão da tarde.


Nota: 7 / 10 



terça-feira, 19 de outubro de 2010

#11. COMPLEXO - UNIVERSO PARALELO


"Complexo - Universo Paralelo" (documentário, Portugal / Brasil 2010)
Realização: Mário Patrocínio
Fotografia: Pedro Patrocínio

# Tive hoje oportunidade de assistir a uma ante-estreia deste documentário, feito por dois irmãos portugueses, e foi uma bela surpresa. Uma obra sincera, tocante e muito imparcial.

Toda a história se passa dentro do "Complexo do Alemão", a maior favela do Rio de Janeiro. No momento das filmagens, o bairro foi alvo de uma grande operação policial, e vive-se quase em estado de sítio. A polícia fala em vários traficantes mortos. Os moradores dizem que a polícia mata quem quer, e que muitos dos falecidos eram simples trabalhadores.

Definida a realidade da favela, parte-se para a história singular de alguns habitantes. A camera (sempre presente de forma muito natural, não interferindo, e bem, na minha opinião) segue a o dia-o-dia na comunidade e foca-se em três pessoas : Dona Célia (mãe de quatro filhos), uma mulher simples, devota, e com muita esperança no futuro, mas que actualmente sobrevive no limite da miséria. Está desempregada e vive da recolha de sucata e lixo; Seu Zé, um dos moradores mais antigos, e que é uma espécie de capataz do bairro, faz da ajuda à comunidade a sua vida, agindo onde o estado não chega;
e MC Playboy, um rapper que ali vive, já senhor de algum sucesso, mas sempre fiel às suas origens. Não foi pelo "vida fácil", ganha a vida a cantar os problemas dos seus vizinhos, e tenta, de alguma forma, dar algo de volta à comunidade.


Dentro destas três realidades, vão sendo inseridas imagens do bairro, degradado, abandonado, cheio de lixo, e também das pessoas, muitas vezes sorridentes e aparentemente felizes.

Algo que também sobressai são sem dúvida as "entrevistas" que esta dupla portuguesa consegue com vários bandidos/traficantes do bairro. De caras tapadas e arma na mão, falam das suas vivências, e do que os fez optar pela vida do crime. Revoltados com a sociedade exterior, consideram-se ajudantes da comunidade, e criticam a violência da polícia. Culpam-na de serem como são. A camera segue-os por dentro das vielas da favela, e apresenta-nos, de forma crua, a sua realidade.

Devo dizer que apreciei bastante a neutralidade com que abordaram este tema especialmente. É claro que não temos o outro lado, o da polícia. Mas a camera limita-se a captar, sem juízos de valor, e essa distância de julgamento marca todo o filme. O que nestas circunstâncias, parece-me ter sido a melhor opção. Afinal trata-se da história do Complexo e todas as suas vivências. A realidade como ela é, sem subterfúgios nem opiniões. É deixado para o espectador assimilar as informações e fazer a sua análise.


A fotografia está muito bem conseguida. Quadros muito bem definidos graficamente, e que enriquecem de sobremaneira o filme. E a luz específica do bairro está bem presente, o que significa que foi feito um trabalho muito cuidado nesse sentido.

No final fica uma óptima sensação, está sem dúvida aqui uma obra digna de registo, e que merece ser vista e apoiada, ainda para mais tratando-se do trabalho de dois portugueses.

Muito bom para começar o dia ou a tarde.

Deixo vos o link do site do filme: http://www.complexofilme.com/
imagens retiradas do site

Nota: 8 / 10

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

#10. MACHETE


"Machete" (EUA, 2010)
Realização: Robert Rodriguez e Ethan Maniquis
Argumento: Robert Rodriguez e Álvaro Rodriguez
Fotografia: Jimmy Lindsey
Actores: Danny Trejo ("Machete Cortez"), Robert De Niro ("Senator John McLaughlin"), Jessica Alba ("Yvetta Sartana"), Steven Seagal ("Torrez"), Michelle Rodriguez ("Luz"), Jeff Fahey ("Michael Booth"), Cheech Marin ("Padre Cortez"), Don Johnson ("Von Jackson"), Lindsay Lohan ("April Booth"), Daryl Sabara ("Julio"), Gilbert Trejo ("Jorge"), Tom Savini ("Osiris Amanpour).

# A história deste filme começou num trailer. Tarantino e Rodriguez juntaram-se para homenagear o cinema série B e criaram "Grindhouse" (em 2007), que consistia numa sessão dupla com dois filmes : "Planet Terror" de Rodriguez, e "Death Proof" de Tarantino. Pelo meio criaram falsos trailers para apimentar a sessão. "Machete" era um deles. A recepção do público foi tão boa, e houve tanta vontade de explorar mais este personagem que Rodriguez decidiu torná-lo em longa-metragem. E deu-se ao luxo de utilizar todas as cenas que faziam parte do trailer. 

Rodriguez vai ainda mais longe nesta sua nova homenagem à série B com muito sangue, nudez e violência e coloca este filme num patamar de culto, sem dúvida.


Machete é um "federale" (agente federal mexicano) que é traído pelo seus companheiros e entregue às mãos do traficante Torrez. Este assassina-lhe a família e deixa-o às portas da morte. Machete sobrevive.
Alguns anos depois no Texas, o actual Senador McLaughlin aperta as leis contra a imigração e está decidido a construir uma barreira eléctrica na fronteira com o México. O problema é que as intenções de voto baixam com medidas tão drásticas. O assessor do senador, Michael Booth (um traficante de drogas e armas, súbdito de Torrez), planeia o assassinato do político por um mexicano, para assim conquistar os eleitores. Por ironia do destino, o escolhido é Machete, que se encontra por esta altura a vaguear pelo Texas à procura de emprego. Uma série de acontecimentos levam a que Machete seja enganado mais uma vez e perseguido pelas autoridades e pelos mafiosos. Apenas conta com a preciosa ajuda da agente Sartana e de uma rede underground de apoio aos imigrantes, liderada por Luz.


O argumento é simples e muito básico, mas a escolha de um casting adequado faz toda a diferença e dá ao filme o sumo que precisa. A personagem principal é um must. Machete não usa armas, só facas e especialmente o seu "Machete" (daí o nome).

Danny Trejo tem o físico ideal e não precisa de actuar muito, pois estamos numa série B, onde os próprios actores não se preocupam com parecerem demasiado óbvios ou clichés. Mas é sem dúvida o papel da sua vida, tanto em termos de relevo, como da imortalização adjacente.
Robert De Niro é o "Senador", com muitas pinceladas de George W.Bush, o texano com a carabina, pronto a tudo para chegar ao poder. Jessica Alba muito bem no papel da "Agente Sartana", um misto de inocente e justiceira, que combina na perfeição. A outra forte personagem feminina é Michelle Rodriguez, no papel de "Luz (aka She)", líder da rede underground. É para mim a mais forte presença do filme (a seguir ao protagonista claro) e a que mais me surpreende pela positiva.


E depois há Steven Seagal a fazer do mau da fita "Torrez". Algo pouco comum, mas que lhe assenta na perfeição neste contexto. Bem coadjuvado por Jeff Fahey, num impiedoso e metódico "Michael Booth". No papel de lider da milícia fronteiriça anti-imigração "Von Jackson" temos Don Johnson, com sotaque do Texas, sempre de óculos escuros e armado até aos dentes. Um saudoso regresso, com Rodriguez a acertar na mouche na escolha do actor. Cheech Marin (uma figura habitual nos filmes do realizador) é o "Padre Cortez", um ex-federale, irmão de "Machete", que largou as armas para se dedicar à religião. São suas algumas das falas mais icónicas do filme. Ainda temos uma curta mas muito curiosa aparição de Lindsay Lohan, no papel de "April Booth". É o melhor desempenho que vi de Lohan na sua carreira. Parece que encontrou aqui a sua praia.

É isso que fica, uma excelente escolha de casting permite que um guião simples e com um "plot" igual a tantos outros, faça com que os personagens sejam o ponto central do filme, e criando aqui uma obra que sem dúvida vai ser falada (pelo menos no meio mais underground) durante muitos anos.
O estilo de realização (e a própria fotografia) também é uma homenagem à série B (tal como em Planet Terror), com muitos zooms tortos, desfoques e rasgos na película, que ajudam a formar a ambiência exacta num filme deste gênero. O que antes foi considerado erro, agora é explorado e aproveitado de forma estética para tornar a experiência ainda mais interessante.


Para mim (que sempre fui fã deste gênero), Rodriguez acertou mais uma vez no alvo, e acredito sinceramente que se deveria dedicar exclusivamente a este tipo de histórias (ele que se aventura muito nos filmes juvenis também, o que é sem dúvida curioso).

"Machete" é do melhor "gore" que se tem feito, e vai ganhar sem dúvida um lugar especial na mente de muitos cinéfilos mais arrojados. É um exemplo de como com uma estética bem definida, e um elenco bem escolhido, se pode criar um filme com base nas personagens, deixando a história para segundo plano. Isto também é cinema!



Muito bom para uma sessão dupla diurna ou nocturna.
E já agora espreitem o site oficial do filme que vale a pena : http://www.vivamachete.com/
Nota: 8 / 10


sábado, 16 de outubro de 2010

#09. THE EXPENDABLES


"The Expendables" (EUA, 2010)
Realização : Sylvester Stallone
Argumento: Dave Callahan e Sylvester Stallone
Fotografia: Jeffrey L. Kimball
Actores: Sylvester Stallone ("Barney Ross"), Jason Statham ("Lee Christmas"), Jet Li ("Ying Yang"), Dolph Lundgren ("Gunner Jensen"), Eric Roberts ("James Munroe"), Randy Couture ("Toll Road"), Steve Austin ("Paine"), Giselle Itié ("Sandra"), Terry Crews ("Hale Caesar"), Mickey Rourke ("Tool"), Bruce Willis ("Mr. Church"), Arnold Schwarzenegger ("Trench").

# É fácil de perceber, olhando para os nomes do cartaz, de que tipo de filme se trata. Sylvester Stallone volta a pegar as rédeas da realização (e também do argumento) e apresenta-nos este filme de acção puro e duro. Não é uma estreia para Stallone, que já tinha realizado quatro da franchise "Rocky" (incluindo o mais recente e muito bem recebido "Rocky Balboa"), e também o último "Rambo", para além de "Saturday Night Live" com John Travolta. 

Desta vez cria um argumento totalmente original, a história de uma equipa de mercenários (ex-soldados veteranos) e suas perigosas missões à volta do mundo. Aproveitou esse facto parar juntar um elenco de habituais estrelas de filmes de acção, criando um produto que poderá tornar-se objecto de culto, sobretudo devido à presença de uma quantidade de ex-libris hollywoodianos dos últimos vinte anos, que obviamente nos trazem uma série de agradáveis reminiscências.


O argumento é simples e recheado de todos os ingredientes dos filmes de acção. Sequências infidindáveis de tiroteios e explosões pontuam quase todo a história. 

Barney Ross é o líder da equipa de mercenários. Depois de uma série de missões bem sucedidas pelos vários cantos do mundo, um novo cliente (Mr Church, uma aparição curta mas muito bem conseguida de Bruce Willis) apresenta-lhe uma missão suicida : assassinar o presidente de uma pequena ditadura sul americana. Depois de a negarem à partida, o apelo interior da justiça clama mais forte e acabam por aceitar o trabalho, iniciando um périplo de acção sem limites. 

A super-equipa de Ross (um Stallone igual a si próprio) conta ainda com Christmas, um exímio em facas (Jason Statham, para mim o melhor do filme), Ying Yang (um Jet Li muito mediano, excepto nas sequências de lutas), Gunner Jensen (um tresloucado - pelo menos ele bem tenta - Dolph Lundgren) e duas estrelas do Wrestling : Tool Road (Randy Couture) e Hail Ceasar (Terry Crews). Os dois falam pouco e lutam muito, como se quer, e para mais também não dava. O intermediário dos negócios é Tool, um tatuador muito espirituoso (Mickey Rourke no registo de.. Mickey Rourke).
Do outro lado temos o ex-agente CIA James Munroe (Eric Roberts, um vilão de estilo já totalmente banalizado) e o seu capanga Paine (Steve Austin, mais um vindo dos ringues de luta livre).


Destaque igualmente para a única presença feminina de relevo no filme, a actriz brasileira Giselle Itié, que no meio de tanta testosterona consegue dar um pequeno ar da sua graça (mas muito pequeno mesmo).

Nota para um cameo especial de Arnold Schwarzenneger, no papel de Trench, que faz uma saudosa e muito curta (trinta segundos) aparição, com direito a punch-line político e tudo.

Stallone adopta um estilo de realização muito "in-your-face" e bastante cru e duro (muito à semelhança do que fez no ano passado com "John Rambo"). As cenas de luta e combates estão como devem estar, rápidas e com muito espalhafato. A fotografia acompanha eficazmente toda esta adrenalina, com sequências muito bem trabalhadas, não fosse o realizador rodear-se do veterano Jeffrey L. Kimball (entre outros trabalhou em "Top Gun", "Beverly Hills Cop II", "True Romance", "Mission:Impossible II"e "The Specialist"). E há um cuidado específico na sonorização, que muitas vezes nos faz sentir dentro de um campo de batalha.



No final acho que nos podermos dar por satisfeitos. O filme dá-nos o que esperamos dele e mais não queremos nós. Acção do princípio ao fim, sem limites.

Bom para uma matiné ou para primeiro filme de uma sessão dupla nocturna.

Nota: 6 / 10

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

#08. JONAH HEX


"Jonah Hex" (EUA, 2010)
Realização: Jimmy Hayward
Argumento: Mark Neveldine e Brian Taylor
Fotografia: Mitchell Amundsen
Actores: Josh Brolin ("Jonah Hex"), John Malkovich ("Quentin Turnbull"), Megan Fox ("Lilah"), Michael Fassbender ("Burke"), Will Arnett ("Lt.Grass"), Michael Shannon ("Doc Cross Williams"), Wes Bentley ("Adleman Lusk"), Aidan Quin ("President Grant").

# É mais uma das grandes apostas de Hollywood para este ano, apresentando um elenco de luxo, e preparando também uma sequela, numa adaptação da banda desenhada com o mesmo nome, da DC Comics. Infelizmente parece-me mais um tiro no pé da indústria cinematográfica norte-americana, de resto já comum quando recorre a este tipo de formato.

Jonah Hex é um soldado sulista (na altura da Guerra da Secessão) que, perante algumas atrocidades cometidas pelo seu General, Quentin Turnbull, acaba por se aliar ao exército do Norte, trair os seus companheiro, e levando à morte do seu melhor amigo Jeb Turnbull. Procurando a vingança do filho, o General executa a mulher e filha de Hex, obrigando-o a assistir. Turnbull desfigura a sua face, e deixa-o a morrer. Jonah Hex é trazido das portas do inferno pelos indíos (a sua mulher era Apache), e transporta uma terrível maldição, enquanto procura incessantemente vingança, percorrendo o mundo em busca do General. Quando Turnbull começa a cometer actos terroristas sobre civis (já depois da guerra ter terminado), e o exército falha em capturá-lo pelos metódos convencionais, o Presidente Grant apela à Jonah Hex para que venha em socorro da nação, e oferece os meios do estado para que capture Turnbull. Para isto ainda conta com a ajuda da bela Lilah, uma prostituta com elevados dotes de pistoleira.

Confusos? É normal, este sucedâneo de acontecimentos decorre em cinco minutos de filme, com recurso a animação pelo meio. Uma tentativa de resumir tudo o que se passa na banda desenhada original e partir para uma nova história.


Em termos estéticos o filme tem bons momentos. O realizador Jimmy Hayward apenas recorre à animação no início e depois tenta adoptar um look western clássico com pinceladas de modernismo. E fica bem que o aspecto seja o mais verosímil possível, pois consegue-nos afastar da realidade BD (não sei se era essa a opção, mas comigo resulta). Em termos históricos, por outro lado, muito pouco está correcto (desde as metralhadoras de Hex, até a uma espécie de bomba atómica que Turnbull rouba do exército).
 E aqui reside a dúvida se o realizador quer fazer viver estes personagens no mundo real (as opções gráficas assim o indicam, tal como algumas referências históricas) ou apresentar um universo totalmente ficcional.


O elenco prometia, mas fica um pouco aquém do esperado. Josh Brolin faz os possíveis como Jonah Hex (tem metade da sua cara desfigurada, logo a sua expressividade é muito reduzida). John Malkovich parece-me um pouco apagado como antagonista. E Megan Fox tanto podia estar a fazer um western como mais uma sequela dos "Transformers", que as semelhanças são bem mais que as diferenças.
O único destaque vai para Michael Fassbender, que faz de Burke - o capanga do General Turnbull - com um look muito "From Dusk Till Dawn vs Clockwork Orange" (a tatuagem e o chapéu) e que consegue agarrar o filme sempre que aparece. E, por incrível que pareça, sobressai ao lado de Malkovich.
A verdade é que o argumento é tão fraquinho, que é difícil estes actores fazerem melhor.

Destaque pela negativa para a cena final, com muito recurso ao CGI (técnica de manipulação digital), que mostra uma enorme explosão em Washington. Está tão fraco que a sensação que fica é de que estamos numa pequena aldeia, com meia dúzia de pessoas.


Acaba portanto por ser uma semi-decepção, só vale a pena mesmo por alguns arrojos visuais (de fotografia e direcção de arte sobretudo) e também pelo excelente trabalho de caracterização do personagem principal.

Razóavel para primeiro filme da sessão da tarde.. e vale adormecer.

Nota: 4 / 10

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

#07. INDIGÈNES



"Indigènes" (França, 2006)
Realização: Rachid Bouchareb
Argumento: Rachid Bouchareb e Olivier Lorelle
Fotografia: Patrick Blossier
Actores: Jamel Debbouze ("Said Otmari"), Samy Naceri ("Yassir"), Roschdy Zem ("Messaoud Souni"), Sami Bouajila ("Abdelkader"), Bernard Blancan ("Sergent Roger Martinez"), Mathieu Simonet ("Caporal Leroux"), Assaad Bouab ("Larbi"), Mélanie Laurent ("Margueritte")

# Este filme traz nos a história real dos soldados africano-francófonos que combateram na II Guerra Mundial pela, na altura, pátria-mãe : a França. Os "Indigènes" (indígenas), como eram conhecidos, eram oriundos das ex-colónias francesas Argélia, Marrocos, Tunísia, Senegal, Costa do Marfim e Mali, entre outros. Mostra-nos o seu percurso desde os combates em Itália até ao sul de França, e posteriormente junto à fronteira alemã, sendo dos primeiros franceses a re-entrar na Alsácia.

Este épico venceu alguns prémios importantes, como o de Melhor Actor em Cannes(atribuído ao conjunto de actores do filme ex-aequo),  César para Melhor Argumento (tendo estando nomeado e perdido todos os outros), e esteve também nomeado para os Óscares como Melhor Filme Estrangeiro. Foi um dos filmes com mais investimento francês dos últimos tempos, mas acabou por ser quase um "flop" de bilheteira.


A verdade é que a premissa prometia bem mais do que o filme nos entrega. Logo à partida estranhei uma coisa: os quatro protagonistas (todos actores franceses de origem árabe) são dos mais conhecidos que há em França. Parece que os personagens foram criados para eles e não o contrário. É um desfilar de estrelas que não se coaduna com a força da história. Depois ver o excelente Jamel Debbouze (o mesmo de "Le Fabuleux Destin d´Amélie" que tem uma deficiência real num dos braços) a nunca assumir a sua incapacidade e a comportar-se como um militar, quando vemos claramente que ele tem um problema, para mim, causa-me alguma celeuma.

A história é interessante, mostra um lado desconhecido da II Grande Guerra, e presta homenagem a estes heróis improváveis, que sendo quase escravos no seu país, vão combater lado a lado pela pátria que os colonizou. E com querer e vontade, aliás são só voluntários. É bonito ver logo no início do filme, numa remota aldeia argelina, a gritarem em árabe que vão salvar a França da invasão alemã e lutarem contra Hitler. Por momentos vi todo o conflito actual incompreensível, depois de tamanha união naquela altura.

O grande problema deste filme, para mim, é que tenta adoptar o "american way" de contar os épicos de guerra, em vez de tentar uma nova fórmula à francesa. Claro que a realidade era bem crua e triste, mas há momentos em que a realização exagera na dramatização dos eventos.


O estilo de Rachid Bouchareb (também co-autor do argumento) é do mais clássico que há, e muitas das sequências de batalha parecem-me um pouco pobres. E já vistas e revistas. Não é isso que nos prende ao filme. A única diferença é mesmo os soldados serem africanos e não americanos. Penso que Bouchareb não conseguiu o resultado que desejava, ficando o filme um pouco aquém do esperado (sobretudo para o enorme investimento), e para o potencial da história que tinha para contar.

Os actores estão todos a um nível regular, não comprometem, nem impressionam. Curiosamente, só o menos conhecido do quarteto é que se distingue. Sami Bouajila (que interpreta o Cabo Abdelkader) consegue elevar mais a fasquia e é uma boa surpresa. Do restante elenco destaco também Bernard Blancan na pele do duro "Sergent Martinez", um pied-noir (franceses nascidos nas colónias) que lidera o regimento africano.


No final sabe a pouco. Sim ficamos comovidos com esta história, mas uma mensagem tão forte como esta, merecia sem dúvida uma abordagem mais cuidada e centrada no que realmente interessa, e não perder-se em infinitos detalhes, que de tão levianamente falados, são descurados no cômputo geral.

Bom para uma matiné de dia de chuva.

Nota: 6 / 10

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

#06. UN PROPHÈTE


"Un Prophète" (França, 2009)
Realização: Jacques Audiard
Argumento: Thomas Bidegain e Jacques Audiard
Fotografia: Stéphane Fontaine
Actores: Tahar Ibrahim ("Malik El Djebena"), Niels Arestrup ("César Luciani"), Adel Bencherif ("Ryad"), Hichem Yacoubi ("Reyeb"), Reda Kateb ("Jordi"), Jean-Philippe Ricci ("Vettori"), Pierre Leccia ("Sampiero"), Jean-Emmanuel Pagni ("Santi").

Como premissa para ver este filme bastaria dizer que ganhou o Grand Prix do Festival de Cannes em 2009. E ainda para mais com um júri presidido por Quentin Tarantino. E não foi só este prémio que o filme ganhou. Foi vencedor de um BAFTA (British Film Awards) para Melhor Filme Estrangeiro, arrecadou 9 Césars (prémios do cinema francês), incluindo Melhor Filme, Melhor Actor, Melhor Fotografia, Melhor Realizador, Melhor Edição, Melhor Actor Secundário e Melhor Argumento. E esteve ainda nomeado para o Óscar de Melhor Filme Estrangeiro. E isto só para citar os mais importantes, pois o protagonista Tahar Ibrahim (no seu primeiro papel em cinema!) venceu prémios de Melhor Actor um pouco por todo o mundo.

É inexplicável como uma obra destas passa despercebida das salas portuguesas. Não é uma obra-prima, mas é com certeza um dos melhores filmes do ano, até da década.


Jacques Audiard escreveu e realizou o filme e mostrou uma nova faceta do cinema francês, ultimamente demasiado perdido em dramas psico-amorosos. Aqui a história é de ficção, mas é tão real e crua a forma como é filmada, que nos deixa praticamente em transe desde o início do filme. Numa história sem heróis, agarramos nos ao protagonista e torcemos por ele durante todo o tempo.

Malik El Djebena é um jovem árabe de segunda geração. Não tem família, não liga à religião, é analfabeto. Assalta um supermercado, anda à tareia com polícias e é preso, condenado a 3 anos de prisão. Todo o resto da história se passa dentro da cárcere, e conta a sobrevivência deste jovem, que acaba por sair de lá um gangster. Aprende a ler, alia-se aos prisioneiros córsegos, vende droga, consegue mexer negócios cá fora, enfim um sem rol de acontecimentos que acabam por torná-lo um verdadeiro barão. A outra personagem forte é César Luciani, um "padrinho" da mafia córsega, que oferece protecção a Djebena em troco de um assassinato. A pouco e pouco vai tendo confiança nele e confia-lhe as suas missões mais secretas.
É muito interessante as diferentes rivalidades dentro das prisões francesas, com árabes de um lado e os gangsters córsegos do outro.

Tahar Ibrahim interpreta brilhantemente o papel do jovem árabe, e sua transformação - tanto psicologicamente, como fisicamente - é soberba. É realmente algo de extraordinário o que este actor consegue fazer neste filme, levando-nos a torcer do início ao fim por este improvável herói.
Niels Arestrup é o gangster córsego, em fim de carreira, e da relação entre os dois vive grande parte do filme. Este actor francês de origem dinamarquesa, faz do Luciani um homem tão cruel, que o mínimo rasgo de simpatia quase que o torna boa pessoa por momentos.

Este é outro factor curioso do filme. Impregnamos nos de tal forma nesta dura realidade, que vivemos cada emoção e esperança do protagonista como se fosse nossa.

A realização de Audiard consegue tudo isto, prender-nos durante todo o tempo. Os seus quadros, tanto do mais simples, como movimentações muito arrojadas, mostra nos como é possível juntar vários estilos dentro de uma mesma história, e nunca perder o rumo. A fotografia e a direcção de arte fazem o resto. Brilhante equipa que Jacques Audiard juntou, e que realmente faz a diferença e sobressai do actual panorama francês.



Grande surpresa realmente não estava à espera. Tinha o filme já comigo há algum tempo e ainda não tinha visto. E fiquei chateado quando percebi que o já devia ter feito.

É realmente uma obra a ser vista e revista. Para qualquer hora do dia ou da noite.

Nota:  9 / 10

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

#05. PREDATORS

"Predators" (EUA, 2010)
Realização: Nimród Antal
Argumento: Alex Litvak e Michael Finch
Fotografia: Gyula Pados
Actores: Adrien Brody ("Royce"), Topher Grace ("Edwin"), Alice Braga ("Isabelle"), Walton Goggins ("Stans"), Oleg Taktarov ("Nikolai"), Laurence Fishburne ("Noland"), Danny Trejo ("Cuchillo")

# Confesso que tinha bastante curiosidade para ver este filme. Fiquei fã da saga desde o seu início ("Predator" de 1987 com Arnold Schwarzenegger) e obviamente a sequela ("Predator 2" de 1990 com Danny Glover). Depois destes dois seguiram-se uma série de filmes baseados na figura máxima da história, e que dá o nome aos primeiros dois filmes ("Aliens vs Predator" de 2004 é um deles). Todos sem grande sumo, limitavam-se a utilizar a franchise para enriquecer mais um pouco os produtores e os criadores do personagem.
Finalmente chega-nos um regresso ao passado, com um argumento muito similar ao primeiro filme, e com um actor a condizer à cabeça. Adrien Brody tem tentado ultimamente mostrar a sua faceta mais violenta e agressiva, abrindo as portas para os filmes de acção. E se com "The Experiment" não me convenceu (muito por culpa do guião), em "Predators" consegue preencher-nos com a sua prestação.
E atenção, a história não tem nada que saber. Mas Brody passa por cima disso e é sem dúvida a figura central do filme.



"Predators" começa literalmente em queda livre. Royce está a cair de um avião adormecido. Acorda a meio do voo e abre o pára-quedas. Caí numa ilha aparentemente deserta. Apercebe-se que mais pessoas vão caindo. Ao juntarem-se descobrem que são todos soldados de elite de forças (e países) diferentes. De forças especiais americanas a yakuzas, passando por um gangster mexicano e um guerrilheiro das RUF da Serra Leoa. Foram escolhidos. Tentam encontrar um caminho de saída, mas cedo descobrem que estão num planeta distante e que se tornaram a caça de um ser alienígena. E dá-se o início das hostilidades com  acção e suspense até ao final.

Sem ser pretensioso, e assumindo-se tal qual como é, "Predators" cumpre o seu papel. O de entreter. Não procura mais do que isso, e isso é a chave para um bom resultado. Dentro do gênero consegue convencer e é uma hora e meia bem passada.

O realizador húngaro Nimród Antal (que já nos tinha trazido "Control" e "Vacancy") opta por um estilo mais perto do clássico com incursões mais arrojadas nos momentos chave. E faz bem. A reminiscência do primeiro filme de 1987 está toda lá (até no décor) e Antal joga bem com a sua camera.



Boa opção foi também a de escolher bons actores secundários para preencher os poucos papeís do filme.
Brody ferozmente hábil no papel de "Royce", e muito bem coadjuvado por Alice Braga ("Isabelle") que nos brinda com um misto de inocente / guerreira, e também por Topher Grace ("Edwin") num aparentemente pacato médico.  O actor protege bem a sua personagem até ao twist final inesperado.
Laurence Fishburne faz o tresloucado "Noland". E apesar do pouco tempo na tela, cumpre com qualidade. É pena que Danny Trejo desapareça logo do filme. Apesar das suas qualidades de actor não serem as melhores, a "faccia" e o look são do melhor para o estilo de personagem.

No final fica uma boa sensação. Não foi tempo perdido. Aconselho, sobretudo para uma tarde bem passada.

Nota : 6 / 10